O blog publica, abaixo, a entrevista que fiz na
rádio Independente, ao vivo, no início da tarde, com a ex-administradora do Hospital da Cidade, advogada Célia Vaz de Campos Trindade.
Armando Anache - Boa tarde, advogada Célia Vaz de Campos Trindade. Eu gostaria de saber como foi feito o saque de R$30 mil da conta corrente do Hospital da Cidade, na sexta-feira (22), conforme informado na manhã de hoje durante entrevista que fiz com a chefe de gabinete da secretária municipal de Saúde, Eliete Ravaglia.Advogada Célia Vaz de Campos Trindade - Armando, eu quero explicar, no momento, que esse saque foi feito concomitantemente, no momento em que nós fomos intimados sobre a decisão da juíza, doutora Simone [Nakamatsu, titular da 1ª Vara Cívil da Comarca de Aquidauana], de que o Hospital estava sob intervenção. Apenas, anteriormente, a responsável pelo setor de pagamento já estava no banco e percebeu, realmente, transferências de valores para fornecedor, bem como fez a retirada de complementação à folha de pagamento de pessoal, com relação ao pessoal que é 'prestador de serviço' e não tem carteira assinada; mas tem o documento, o contrato de prestação de serviço. No dia 21 [de dezembro, quinta-feira] nós transmitimos à Caixa Econômica [Federal, agência de Aquidauana] os valores para pagamentos de funcionários contratados e eles foram realizados. O próprio prefeito municipal de Aquidauana [Felipe Orro], que recebeu o cheque dos R$300 mil; o presidente da Associação Aquidauanense de Assistência Hospitalar endossou esse cheque e passou para o prefeito municipal; foi ele que fez a transferência desse recurso para a Caixa Econômica Federal, onde já estavam, já haviam sido transmitidos, os valores para serem creditados a cada funcionário. Houve um problema, e eu já liguei agora à Caixa Econômica, na folha de fevereiro - houve algum problema na transmissão - e esse dinheiro está na CEF, eu já estou com os recursos, com a declaração da Caixa, dos R$30 mil, que estão lá.
Quanto aos saques, já passamos ao Conselho Municipal de Saúde, através do seu presidente, o senhor Adriano Pires [médico da prefeitura e diretor do Pronto Socorro Municipal desde 1º de abril, quando a prefeitura assumiu a direção, substituindo a Associação Aquidauanense de Assitência Hospitalar], que é hoje o presidente da Associação Aquidauanense de Assitência Hospitalar; que nos dê prazo de 24 horas para respondermos sobre essa retirada. Nós já respondemos dentro do prazo, os documentos estão em poder da Associação Aquidauanense de Assistência Hospitalar - lá dentro, fechados, pois nós não temos mais acesso -; inclusive a notificação, a intimação da juíza [da 1ª Vara Cívil da Comarca de Aquidauana, Simone Nakamatsu]; eu não tenho documento nenhum para fazer a defesa do Hospital, porque está preso (sic) dentro da sala da administração e só depois eles nos fornecerão cópia desses documentos; mas está tudo documentado, está na parte contábil, lá [no Hospital da Cidade]; e para quem for apurar a situação do Hospital.
Armando Anache - Na sexta-feira (22), quando a juíza Simone Nakamatsu deferiu a liminar, determinando a intervenção da prefeitura no Hospital da Cidade, a senhora já providenciava, desde o dia anterior, a transferência dos R$300 mil repassados à prefeitura de Aquidauana pelo governo do Estado. Eu gostaria de saber se, quando foi feito o saque de R$30 mil, a administração do Hospital já tinha conhecimento da liminar concedida pela Justiça.Célia Vaz de Campos Trindade - Armando, eu quero, primeiro, esclarecer que, dos R$300 mil, não saiu nenhum R$30 mil. Os R$300 mil foram depositados, na sua íntegra, na Caixa Econômica Federal, para atender ao pagamento de pessoal. Só que os R$300 mil não seriam suficientes para cobrir o pagamento de, como nós fizemos no dia 22 [de dezembro, sexta-feira], com a transferência da manutenção da conta saúde, que é a empresa que mantém o nosso sistema de AIH (Autorização de Internação Hospitalar) e, bem como, dos funcionários prestadores de serviços. Esse valor de pagamento, de transferência, foi solicitado pelo Conselho Municipal de Saúde, não é do valor dos R$300 mil, e sim de recursos que já estavam depositados na conta do Hospital da Cidade e que teria, sim, que fazer a complementação dos R$300 mil.
Então, com esse valor, que foi solicitada informação pelo Conselho, é de conta diferente e não é referente aos R$300 mil, como se noticiou pela internet. Não tem. Os R$300 mil estão na Caixa Econômica e foram creditados diretamente pelo pessoal que recebe normalmente em dia, com a conta na Caixa Econômica. Então, é na outra conta bancária da Associação, que teria que ser feita a complementação, é que foi feito um saque - eu não tenho aqui o valor - mas foi transferido para a conta saúde dez mil e poucos reais e R$24 mil para salário família, pensão alimentícia, o próprio advogado do Hospital e funcionários que são prestadores de serviços, não com carteira, mas com contrato de trabalho.
Armando Anache - Portanto, para deixar bem claro aos ouvintes: Os R$30 mil sacados na sexta-feira (22) não eram parte daquele total de R$300 mil repassados pelo governo de Mato Grosso do Sul para a prefeitura?Célia Trindade - Não.
Armando Anache - Os R$30 mil sacados da conta do Hospital estão à disposição da instituição?Célia Trindade - Armando, não houve saque de R$30 mil na Caixa Econômica Federal. Houve um depósito de R$300 mil, para ser transferido para cada funcionário. O que houve foi um pagamento, por outra conta do Hospital, não por conta dos R$300 mil.
Armando Anache - Se entendi bem, os R$30 mil que forama sacados na sexta-feira (22) são oriundos de outras fontes de crédito do Hospital da Cidade?Célia Trindade - Sim, é ... Dá licença um minutinho, Armando, pois estou pegando aqui os documentos ...
Armando Anache - Pois não, fique à vontade, pois o objetivo da entrevista é levar ao ar dados corretos, confirmados depois de rigorosa apuração.Célia Trindade - Aqui estão os documentos que passei ao presidente do Conselho Municipal de Saúde, fazendo esses esclarecimentos. Foram feitos dessa forma [os pagamentos], Armando: R$23.376,00 foram pagos a funcionários, conforme documento 'recibado' lá no Hospital; e foi feita uma transferência no valor de R$11.065,25, sendo R$8.666,00 para a conta saúde e manutenção do programa de AIH, R$2.400,00 para chaves e carimbos, da Papelaria Cruzeiro do Sul, conforme nota; ficou, deste valor, solicitado pelo Conselho, pois eles alegam que houve o saque, ficou o saldo de R$330,50 que encontra-se à disposição para os pensionistas que vão retirar lá no Hospital; eles não têm contas bancárias e ficou, ainda, R$228,25 restantes do saque, em poder, está lá dentro do Hospital, no cofre.
Então, nem sei o que está havendo com esse problema desses R$30 mil, que não houve na realidade. Os valores foram esses que eu já disse. Todo esse dinheiro tem como origem receitas próprias do Hospital, nada tendo a ver com os R$300 mil repassados pelo governo de Mato Grosso do Sul, via prefeitura. Na realidade, o que teria que ser repassado para pagamento de pessoal seria R$300 mil mais esses valores que citei, de R$23.376,00 mais R$2.400,00. Então, na realidade, o que seria pagamento de pessoal daria um total de R$338 mil. Portanto, R$38 mil são complementados por recursos da conta do Hospital.
Armando Anache - Houve a informação, também, advogada Célia Trindade, de uma outra verba, de pouco mais de R$51 mil, destinada aos médicos da UTI (Unidade de Terapia Intensiva). A senhora confirma?Célia Trindade - São R$55 mil que já foram transferidos para a conta da empresa que presta serviços, com os médicos. O cheque já está preenchido lá hospital e falta só recolher o ISS da prefeitura.
Armando Anache - A chefe de gabinete da secretária municipal de Saúde, Eliete Ravaglia, disse nesta manhã, aqui no Programa Armando Anache, na rádio Independente, que foi preciso chamar a Polícia Militar no sábado (23), quando a senhora tentava retirar documentos do Hospital da Cidade. A senhora poderia falar sobre isso?Célia Trindade - Confirmo isso e é o motivo pelo qual fui agora há pouco até a delegacia de Aquidauana, Armando, pois entendo que foi um ato de truculência, um ato imoral, um ato não lícito, porque não houve determinação judicial de que assim houvesse esse procedimento. Quando fui notificada de que o Hospital estava sob intervenção [da prefeitura de Aquidauana], o que é que eu tinha que fazer? Eu tinha que tirar os meus documentos pessoais e, até mesmo, o documento da intimação de que o Hospital estava sob intervenção. Até esse documento, Armando, eu não tenho em mãos, para fazer a minha defesa, porque está preso lá no Hospital, porque vão tirar fotocópias do ato da juíza, e só hoje eu tomei ciência desse documento.
Então, eu estou sendo tratada como bandida, Armando. E é isso aí que é terrível, porque isso aí ... O ato da juíza não foi para fazer esse procedimento, jamais. E você conhece, eu tenho 13 anos naquele Hospital e, dentro da minha sala, eu tenho documentos meus, documentos pessoais, documentos do Rotary Club, documentos do Clube da Melhor Idade, da Federação da qual eu sou vice-presidente da Federação dos Hospitais Filantrópicos e nem isso, retirando isso, eu sou uma bandida; eu estava tirando como uma bandida. Então, teve que chamar a presença de um policial, que não tinha nenhuma determinação para que assim procedesse; e o 'camburão' [veículo da Polícia Militar, caracterizado e com local para o transporte de presos na parte traseira] dentro do pátio do Hospital da Cidade, e com uma platéia de todos os conselheiros, o presidente do Conselho [Municipal de Saúde], a doutora Viviane [Nogueira, secretária de Saúde do município de Aquidauana]. Então, foi um ato de truculência, Armando. É isso aí que eu acho. Um ato de barbaridade. Agiram como se, nesse país, tudo fosse muito correto, tudo muito limpo ou, então, estão muito acostumados a lidar com bandidos, porque, acharam, 'vamos agora pegar mais uma bandida', 'vamos à caça de mais um bandido' e, por isso, eu tenho que tomar providências, eu tenho que ir ao Fórum, novamente, para pedir a cópia do ato em que eu fui intimada, porque eu não fiquei com esse documento, Armando. Eu não tenho o documento para a minha defesa. Não tenho a sentença da juíza e não tenho o parecer do promotor público.
Eu estou viajando agora, estou indo para Brasília, sem essa documentação.
Armando Anache - A senhora é advogada e acaba de dizer que foi tratada, no seu entendimento, 'como uma bandida' ...Célia Trindade - Como uma bandida, simplesmente. Perante os meus funcionários, a sociedade de Aquidauana, eu passei a ser uma bandida. Hoje, o presidente do Rotary Club me telefonou, o doutor Olímpio - que é um sujeito assim, de uma linha, de uma idoneidade -, então, perguntando, por qual motivo. Eu falei: Olha, Olímpio, decerto eu sou uma rotariana bandida.
Armando Anache - Eu pergunto: Isso, no entendimento da senhora, que é advogada, teria caracterizado um constrangimento ilegal, ou algo pior?Célia Trindade - Dos piores, Armando. Dos piores. E por isso eu já passei essa informação para a Federação, para a Confederação das Santas Casas do Brasil; passei para a nossa assessoria da Federação dos Hospitais Filantrópicos, para que sejam tomadas as medidas cabíveis. Está sendo convocada uma assembléia em nível de estado, no dia 3 de janeiro próximo, em função do recesso da Justiça, para que se tomem as medidas necessárias e cabíveis, porque não é possível, é inadmissível isso tudo que aconteceu. É admissível que, na véspera do Natal [falando com voz embargada, emocionada], no dia em que eu estava recebendo os meus familiares, a gente passou por uma situação de constrangimento, dessa forma? É inadmissível, inadmissível.
Armando Anache - Advogada Célia Vaz de Campos Trindade, a senhora me dizia, há pouco e fora do ar, que estava indo ao 1º Distrito Policial de Aquidauana, com o seu advogado. Qual foi o motivo que a levou à delegacia?Célia Trindade - Exatamente para informar dessa situação de constrangimento, Armando. Porque eu fui na sexta-feira (22) lá na delegacia e não tinha ninguém para lavrar essas ocorrências. Então, hoje é que essas ocorrências foram lavradas; eu estou com as cópias, porque está abrindo um processo [na realidade, inquérito policial que, depois, poderá ser transformado em processo, no âmbito da Justiça], que deverá ser encaminhado normalmente. Infelizmente, eu ..., houve toda essa situação, uma situação de um constrangimento muito grande pra mim, pra meus familiares, pra meus amigos [a voz volta a ficar embargada, com início de choro] e, e..., eu tenho uma confiança de que isso tudo vai ter um retorno, Armando.
Armando Anache - "Salvo melhor juízo dos mais doutos", como dizem os advogados, e a senhora é uma advogada, eu pergunto: A senhora deu entrada com uma 'queixa-crime', por tratar-se de crime supostamente cometido contra a senhora e que requer uma ação privada na Justiça?Célia Trindade - É exatamente isso, Armando.
Armando Anache - A senhora acusa quem? Deu entrada com uma queixa contra quem?Célia Trindade - Eu fiz a queixa contra a doutora Viviane [Nogueira, secretária municipal de Saúde e Saneamento], que compareceu acompanha da doutora Solange Lima e do presidente do Conselho Municipal de Saúde, médico Adriano Pires. Todas as providências que eu poderia tomar eu tomei nesta manhã. Tenho um prazo, ainda, de 10 dias para entrar com um agravo na Justiça [contra a liminar que determinou a intervenção da prefeitura no Hospital da Cidade], mas antes eu preciso do documento, [cujo acesso] foi cerceado a esse documento, pois está retido lá no Hospital da Cidade. Mas eu acredito que tudo deverá correr da melhor forma possível. A gente ainda tem que ter confiança, um pouco de confiança na Justiça - embora a gente esteja muito descrente, de tudo que acontece (sic) e, mas, eu acredito que tudo venha a ser resolvido a contento e cada um passe e pende um pouco no que fez e repense nas suas posições.
Armando Anache - Eu ouvi o prefeito de Aquidauana, Felipe Orro (PDT), dizer que "há muita política nessa questão relacionada ao Hospital da Cidade." Fora do ar, a senhora também fez o mesmo tipo de comentário. Afinal, há muita política ou 'politicagem' nessa questão?Célia Trindade - Armando, eu acredito que, em pouco tempo, a gente tenha uma resposta para tudo isso. Eu não posso julgar, eu não sou política. Eu acredito que exista problema político, sim. E muito. Só que uma política muito [faz uma pausa para pensar], muito ... suja. Acontece que isso aí, cada um, muito breve, a gente terá uma resposta para todo esse problema. Eu apenas peço para que os antigos funcionários tenham paciência, tenham cautela e aguardem, sem comentários, os resultados de tudo isso. Para o bem deles, para o bem dos pacientes e da população, que terá, muito breve, a resposta de tudo isso.
E eu agradeço a você também, Armando, pela atenção, por ter ouvido a outra parte.
Armando Anache - Não há o que agradecer. Essa é a função do jornalista profissional. Só mais uma pergunta: A senhora tem o valor exato do débito, das dívidas da Associação Aquidauanense de Assitência Hospitalar?Célia Trindade - Sim, tenho. Hoje, possivelmente, a tarde, a secretaria de Saúde deverá ter conhecimento. Porque é muito fácil dizer que você não tem o valor, ou que você duvida e, também, me deixa até em dúvida, quanto a realidade do que vai ser apurado, tendo em vista que os direitos da Associação foram todos cerceados. Então, a gente diz que todos os documentos do Hospital da Cidade estão em poder da prefeitura, sem nenhum documento com a sua direção administrativa, com o seu presidente, com o seu conselho fiscal, nada, nada.
Comentário do blog: O Programa Armando Anache, que apresento na
rádio Independente, das 8h às 10h15, de segunda-feira a sábado, pode ser ouvido ao vivo, via internet.
Para ouvir a rádio Independente ao vivo, 24 horas no ar, clique
AQUI
Comentário do blog II: Deve haver algum engano na informação dada pela advogada Célia Trindade. Conforme o "Manual de Redação da Folha de S. Paulo" (Ed. Publifolha, 2001, pág. 164), "queixa-crime" é peça técnica, elaborada por advogado e dirigida ao Poder Judiciário. Dá início à ação penal privada. Existe para crimes que não são de ação pública, como injúria e concorrência desleal. Não confundir com o registro de ocorrência criminal feita em delegacia de polícia: tecnicamente, é errado afirmar que alguém fez uma queixa na delegacia.