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Blog do Armando Anache e "A luta de um repórter ..." http://aaanache.googlepages.com/home

"Tudo o que é verdade merece ser publicado, doa a quem doer" (Armando Anache) "De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer as injustiças, de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto" (Rui Barbosa) "Se pudesse decidir se devemos ter um governo sem jornais ou jornais sem governo, eu não vacilaria um instante em preferir o último" (Thomas Jefferson)

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Jornalista (MTb 15083/93/39/RJ) formado pela PUC-RJ em 1987 e radialista (MTb 091/MS)- Produtor de programas de rádio e repórter desde 1975; cursou engenharia eletrônica na UGF (Universidade Gama Filho, RJ) em 1978; formado pelo CPOR-RJ (Centro de Preparação de Oficias da Reserva), 1979, é oficial R/2 da reserva da arma de Engenharia do Exército; fundador e monitor da rádio PUC-RJ, 1983; repórter e editor do Sistema Globo de Rádio no Rio de Janeiro (1985 a 1987); coordenador de jornalismo do Sistema Globo de Rádio no Nordeste, Recife, PE(1988/1989);repórter da rádio Clube de Corumbá, MS (1975 a 2000); correspondente, em emissoras afiliadas no Pantanal, da rádio Voz da América (Voice Of America), de Washington, DC; repórter da rádio Independente de Aquidauana, MS (www.pantanalnews.com.br/radioindependente), desde 1985; editor do site Pantanal News (www.pantanalnews.com.br) e CPN (Central Pantaneira de Notícias), desde 1998; no blog desde 15 de junho de 2005. E-mails: armando@pantanalnews.com.br ; armandoaanache@yahoo.com

domingo, novembro 20, 2005

Marcelo Leite: O infortúnio de Francelmo

O blog publica artigo de Marcelo Leite, da edição de hoje do jornal "Folha de S. Paulo":

O infortúnio de Francelmo
MARCELO LEITE, COLUNISTA DA FOLHA

Tomo de empréstimo a Marcelo Coelho a lembrança do par de categorias políticas imortais do pensador italiano Nicolau Maquiavel (1469-1527), "fortuna" e "virtù", que ele aplicou ao depoimento do ministro da Fazenda, mas para tratar da morte de Francisco Anselmo Gomes de Barros, o Francelmo. O jornalista, presidente da Fundação para Conservação da Natureza de Mato Grosso do Sul (Fuconams), ateou fogo às roupas há oito dias, em protesto contra instalação de usinas de açúcar e álcool nas imediações do Pantanal. Morreu um dia depois, em conseqüência das queimaduras.

O suicídio, qualquer suicídio, é como um buraco negro ou o Big Bang -uma singularidade impenetrável

Antes de iniciar a temerária análise, é bom esclarecer que não vejo sentido em julgar ou interpretar o ocorrido com Francelmo em termos pessoais, psicológicos ou emocionais. O suicídio, qualquer suicídio, é como um buraco negro ou o momento do Big Bang -uma singularidade impenetrável. Mesmo quem conhece o suicida se vê engolfado por uma nuvem de absurdo, comparável talvez, unicamente, àquela que sufocou o sujeito e o precipitou no abismo. Não há o que explicar.
Acontece que a imolação de Francelmo foi um ato político, assim projetado por ele. Convida ao debate, e não apenas do alvo visado (Pantanal), mas igualmente do cálculo e da estratégia empregados. É aqui que a "fortuna" (ou "sorte") e a "virtù" ("habilidade") maquiavelianas vêm a calhar. E, também, o paralelo óbvio com a greve de fome do bispo Luiz Flávio Cappio em favor da revitalização e contra a transposição do rio São Francisco.
Dom Luiz revelou-se um poço de "virtù". Quer dizer, daquilo que Coelho retomou como "a audácia, a iniciativa política, o poder de convencimento". Em questão de horas, o projeto de suicídio lento e midiático do franciscano forçou a inclusão de um tema ambiental entre as manchetes normalmente refratárias às investidas dos "ecochatos" (com exceção para as imagens poderosas das catástrofes). Lançou também o governo federal contra a parede.
Pouco importa, aqui, que o debate tenha secado como secam quase todos os rios nordestinos -rapidamente. Por uns poucos dias, viveu-se a miragem de que o sertão eleitoreiro viraria um mar de dados, argumentos e esclarecimento. Com toda a sua "virtù", o bispo percebeu que era chegado o momento de negociar e pôs fim à iniciativa.
O ato de Francelmo se revelou muito mais grave. Embora com objetivo semelhante, sugere que foi movido por intuição e não cálculo, desespero e não estratégia. Salvo engano, nem chegou a ser registrada a imagem de seu corpo em chamas (como aquelas de monges budistas no Vietnã que assombraram uma geração, como lembrou Mauricio Tuffani). Tudo ali era incerto, em matéria de resultados.
Francelmo contou exclusivamente com a sorte, ou seja, abraçou a "fortuna". Fez uma aposta e pagou com a própria vida, mas não para ver. O melhor indicador de que eram grandes as chances de morrer em vão está nas palavras de sua carta à imprensa: "Já que não temos voto para salvar o Pantanal, vamos dar a vida para salvá-lo".

Marcelo Leite é doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, autor do livro "O DNA" (Publifolha) e responsável pelo blog Ciência em Dia (http://cienciaemdia.zip.net).
E-mail: cienciaemdia@uol.com.br