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"Tudo o que é verdade merece ser publicado, doa a quem doer" (Armando Anache) "De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer as injustiças, de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto" (Rui Barbosa) "Se pudesse decidir se devemos ter um governo sem jornais ou jornais sem governo, eu não vacilaria um instante em preferir o último" (Thomas Jefferson)

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Jornalista (MTb 15083/93/39/RJ) formado pela PUC-RJ em 1987 e radialista (MTb 091/MS)- Produtor de programas de rádio e repórter desde 1975; cursou engenharia eletrônica na UGF (Universidade Gama Filho, RJ) em 1978; formado pelo CPOR-RJ (Centro de Preparação de Oficias da Reserva), 1979, é oficial R/2 da reserva da arma de Engenharia do Exército; fundador e monitor da rádio PUC-RJ, 1983; repórter e editor do Sistema Globo de Rádio no Rio de Janeiro (1985 a 1987); coordenador de jornalismo do Sistema Globo de Rádio no Nordeste, Recife, PE(1988/1989);repórter da rádio Clube de Corumbá, MS (1975 a 2000); correspondente, em emissoras afiliadas no Pantanal, da rádio Voz da América (Voice Of America), de Washington, DC; repórter da rádio Independente de Aquidauana, MS (www.pantanalnews.com.br/radioindependente), desde 1985; editor do site Pantanal News (www.pantanalnews.com.br) e CPN (Central Pantaneira de Notícias), desde 1998; no blog desde 15 de junho de 2005. E-mails: armando@pantanalnews.com.br ; armandoaanache@yahoo.com

domingo, junho 22, 2008

Artigo de Miguel Reale Júnior: Mordaça judicial

O blog publica, abaixo, artigo de Miguel Reale Júnior, publicado na edição de hoje do jornal "Folha de S. Paulo":

TENDÊNCIAS/DEBATES


Mordaça judicial

MIGUEL REALE JÚNIOR


Colocar a igualdade entre os pré-candidatos acima da liberdade de manifestação e do direito de informar é instaurar a censura


ENTREVISTA com a pré-candidata Marta Suplicy foi publicada na Folha de 4 de junho. O jornal e a pré-candidata foram condenados ao pagamento de multa pela Justiça Eleitoral, que considerou haver propaganda antecipada, antes da data permitida. A sentença condenatória fundamentou-se na ofensa ao princípio da igualdade e na extemporaneidade da "propaganda". A sentença assevera que os concorrentes a cargos eletivos "devem contar com as mesmas oportunidades".
No condicional, supôs que a "publicação de entrevista em mídia escrita poderia violar a igualdade entre os pré-candidatos, ao permitir que um deles expusesse, antes dos demais e fora do período permitido, sua pretensão de concorrer ao cargo, sua plataforma de governo, enaltecendo suas qualidades e realizações passadas, criticando as ações do atual governo e imputando qualidades desfavoráveis aos adversários".
No conflito de princípios entre a liberdade de manifestação de pensamento e a igualdade de oportunidades para os pré-candidatos, deve prevalecer, segundo a sentença, o da igualdade, ao vedar entrevista em mídia escrita para a realização de propaganda no período pré-eleitoral, malgrado o inquestionável interesse público da matéria.
Ao ver do juízo, a matéria exorbitou do mero interesse jornalístico, a ponto de caracterizar propaganda eleitoral extemporânea, pois, em mensagem direta ao eleitorado, propagou a entrevistada ser a mais preparada, com as melhores propostas, configurando-se típica propaganda direta e extemporânea, dirigida a todos os eleitores.
O jornal foi condenado por haver elaborado perguntas propiciadoras de respostas que caracterizaram propaganda eleitoral, além de escolher as manchetes, de claro conteúdo propagandístico: "Quero reconquistar a classe média que eu perdi em 2004". Tudo segundo aquele juízo.
Na verdade, o juiz titubeia: ora fundamenta a decisão na afronta à igualdade, ora no fato de a entrevista ter sido publicada antes do prazo, considerando-a um ato de propaganda. Fica-se a perguntar: se a entrevista fosse ao período de propaganda, seria de somenos a afronta à igualdade? Se assim for, o relevante seria apenas ter havido propaganda antecipada, desde que se julgue a entrevista como ato de propaganda.
Primeiro, não há afronta à igualdade: um jornal, no interesse de informar para atender ao direito de ser informado, não pode ser coartado, em estreita visão legalista, a tratar identicamente todos os pré-candidatos, concedendo-lhes página inteira, como se a realidade não trouxesse diferenças intransponíveis de qualidade e de importância dos pretendentes.
Como atender a essa propalada igualdade? Dedicando, no mesmo dia, um caderno a entrevistas com todos os possíveis pré-candidatos? Ora, a entrevista com um não impede no futuro que outro pré-candidato representativo seja entrevistado. No caso, portanto, colocar a igualdade acima da liberdade de manifestação e do direito de informar é instaurar, por vias transversas, a censura.
Por outro lado, a entrevista nem de longe se assemelha à propaganda. A entrevista em tela girou em torno de assuntos diversos do jogo político, muitas vezes de forma constrangedora e provocativa à entrevistada, longe da finalidade de constituir promoção da pré-candidata, que pode, vez ou outra, ter puxado a sardinha para a sua brasa, mas nem por isso a ponto de transformar o debate em propaganda. Impedir o questionamento amplo, como o ocorrido nessa entrevista, é instalar o obscurantismo e matar a vida política.
Como deveria, ao ver do juiz, ser uma entrevista nada promocional, não dirigida aos eleitores em geral? O jornal deveria alertar para que cuidasse em não se promover e não se voltar aos eleitores ao responder, por exemplo, sobre a prioridade de sua nova gestão ou se o presidente Lula a apoiaria. A entrevistada deveria, então, dizer: "impossível responder sobre prioridade sem me dirigir aos eleitores em geral, pois estaria a fazer propaganda. Igualmente, não posso responder, diante da popularidade do presidente, se ele me apoiaria ou não". Talvez essa entrevista fosse aprovada pela Justiça Eleitoral.
De outra parte, a condenação do jornal por ter feito pergunta que permitiu à entrevistada falar em seu próprio favor é ver o texto, não o contexto, é estabelecer uma co-autoria fundada na responsabilidade objetiva.
Como se vê, a decisão fugiu do bom senso, da prudência, do respeito ao embate de idéias no processo eleitoral. Enterrou-se a política como inteligência para transformá-la em mera medição aritmética.


MIGUEL REALE JÚNIOR , 64, advogado, é professor titular da Faculdade de Direito da USP e membro da Academia Paulista de Letras. Foi secretário da Segurança Pública (governo Montoro) e da Administração (governo Covas) do Estado de São Paulo e ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso.