Sem-tetos, sem-vergonhas, sem-votos em Corumbá
Por Armando de Amorim Anache (*)
O corumbaense é festeiro, receptivo, simpático, alegre e excelente anfitrião.
São características que vêm das nossas raízes, com as presenças da Marinha, com muitos militares do Rio de Janeiro, que nos trouxeram o jeito descontraído de ser; e do Exército, também com muitos cariocas nas suas fileiras, desde os tempos da Colônia.
Afinal, Corumbá foi fundada em 21 de setembro de 1778, no local onde hoje está o distrito de Albuquerque. É uma terra de tradições, lutas, culturas e glórias.
Povo hospitaleiro por tradição, o corumbaense gosta de compartilhar suas alegrias. Por isso, sempre que há festa na Cidade Branca, os políticos de outros municípios são convidados.
As autoridades locais também gostam de compartilhar as suas conquistas.
Existe felicidade maior do que aquela proporcionada por uma inauguração de uma obra, de uma benfeitoria para um bairro, uma vila, uma rua, uma avenida, ou para todo o município?
Alguns desses políticos parceiros – chamados “de fora”, porque exercem cargos estaduais ou federais e que, muitas vezes, são corumbaenses –,demonstram, às vezes, súbito esquecimento dessas particularidades desta fronteira.
Afinal, qual é a cidade que leva banda de música, charanga, bateria de escola-de-samba, trio elétrico, imprensa e, claro, o mais importante, o povão ao lado das autoridades locais, para recepcionar no Aeroporto Internacional, o governador, os deputados, os senadores, um ministro ou o presidente da República?
Claro que é a nossa Corumbá! Respondo sem medo de errar. Já presenciei, em algumas cidades do Mato Grosso do Sul, a chegada de autoridades. Parece até velório daquela pessoa que morreu sem amigos. Ninguém aparece! Quando muito, lá estão o prefeito e alguns assessores e bajuladores.
E, agora, parece ter virado moda, ou mania, ou falta de ... Bem, deixa pra lá!
A verdade é que a mais recente forma de agir de algumas autoridades é, sempre que convidadas para eventos em Corumbá, confirmar as honrosas presenças e, depois, “muito preocupadas”, alegam que não poderão vir.
O motivo? É simples: “Não há teto”, elas informam. O Aeroporto de origem ou o de Corumbá, ou ambos, “não têm teto e os aviões não podem decolar ou pousar.”
E essas autoridades, pobrezinhas, ficam “muito tristes na representação adrede preparada”. Não queriam faltar aos compromissos assumidos em solo corumbaense.
São as autoridades sem-tetos (no plural, porque são várias, em pelo menos dois aeroportos). Elas se esquecem, no entanto, que o povo corumbaense pode ficar sem tudo, mas não perde, jamais, o bom humor.
Nas ruas, já posso imaginar alguns comentários.
São assim: “Autoridades sem-tetos, lá e cá, para voar? Mas o tempo estava bom, informou a reportagem. Não aceitaram o nosso convite? Tudo bem, vão sambar no futuro. Sem-tetos nos aeroportos, sem-povo na recepção, sem-festa completa devido à tristeza causada pelas ausências que se assemelham aos descaso com o nosso povo festeiro, sem-carinhos, sem-amores, sem-culturas, sem-juízos, sem quê nem para quê, com descaso sem-fim, semi-almas, sem-responsabilidades, sem-vergonhas de não vir, sem-votos, sem-eleições, sem-mandatos!”
E no Salão Imperial, do Nelsão, na Galeria Pantanal? O que se fala? É melhor nem pensar!
Pronto! Está resolvida a fatura. Os políticos sem-tetos de hoje serão os sem-votos e sem-mandatos de amanhã.
Dá até para montar um samba-enredo para uma escola-de-samba de Corumbá.
Obrigado, políticos que não têm vergonha de usar desculpas esfarrapadas, relegando a nossa Corumbá a um segundo plano. Pelo menos, terão dado uma contribuição ao nosso carnaval, ao qual pedimos que não venham, a partir de 21 de fevereiro, sábado gordo. Estarão com aviões, mas em aeroportos sem-tetos. E os senhores, se aqui chegarem, por terra, só servirão para atravessar o samba, que nesta terra sempre foi de primeira categoria.
E viva Corumbá! Cidade Branca que, com ou sem-teto, “melhor não há, nem cá nem lá”, como escreveu o poeta.
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