Artigo: As tornozeleiras e o PCC
Por Dirceu Cardoso Gonçalves (*)
O governador de São Paulo que, no ano passado, levou ao Senado um projeto propondo o uso de tornozeleiras para controlar os detentos em saída temporária, anunciou solenemente que sancionará projeto nesse sentido aprovado pela Assembléia Paulista. . Medida coerente e avançada. Especialmente se vier acompanhada de outras providências. De nada adiantará colocar o espião eletrônico no pé do presidiário sem lhe proporcionar os seus direitos básicos de saúde, atendimento médico e psicológico e, principalmente, assistência jurídica para evitar que continue cumprindo pena mais severa quando já tem direito à mais branda ou até ao livramento condicional.
A simples adoção de tornozeleiras não deve ser apresentada como a panacéia e solução dos problemas do falido sistema prisional. Há muito a se fazer para alcançarmos o necessário equilíbrio e a eficiência desejada. Uma bem constituída comissão de notáveis do setor seguiu, dias atrás, para os Estados Unidos, a convite do governo norte-americano (que está preocupado com as ações do PCC e as FARC na América do Sul), para conhecer o trabalho nas penitenciárias e no sistema de inteligência policial. Seus membros devem voltar cheios de informações positivas e fórmulas milagrosas. Mas não podem se esquecer de que tudo aquilo só funciona porque lá também se cumpre efetivamente outros pré-requisitos sociais.
A crise carcerária brasileira é antiga. Por décadas o setor foi mantido no mais completo abandono e sem nenhuma melhoria. As celas dos distritos policiais transformaram-se em superlotadas possilgas, o mesmo aconteceu com a Casa de Detenção – que o governo, demagogicamente, demoliu em vez de recuperar – e há tempos pratica-se a equivocada, dispendiosa e negligente política de espalhar os apenados da capital pelas pequenas e médias cidades do interior, que não têm a necessária estrutura para recebê-los, nem às suas famílias.
As autoridades devem estar conscientes de que facções como o PCC (Primeiro Comando da Capital) e similares só sobrevivem porque há um vácuo entre o poder constituído e os presidiários, da mesma forma que o crime organizado só assume bairros e parcelas das cidades – notadamente as periferias – porque o inerte poder público é ausente e não cumpre suas obrigações de arrecadador de impostos.
A aplicação das tornozeleiras não sobrevive isoladamente, mesmo custando alguns milhões de reais na aquisição das peças e de seu monitoramento. Além dessa tecnologia, o setor carece de assistência judiciária atualizada, uma redistribuição que devolva o detento para perto de sua casa e família, e da transformação das penitenciárias em verdadeiras casas de recuperação, em vez dos “escritórios do crime” proporcionados pela entrada fácil dos telefones celulares. O Estado tem uma longa folha de obrigações a cumprir...
(*) Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
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